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Estado de SP esconde milhares de cargos comissionados

em Aparelhamento/Opacidade

Todos os anos o Governo do Estado de São Paulo esconde milhares de cargos comissionados da prestação de contas oficial. Os cargos comissionados de comando para os quais servidores não foram nomeados, mas sim designados, são considerados vagos. Na prática, a designação para responder pelo expediente de cargo de comando vago funciona como um Caixa 2 de cargos comissionados.

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Relação oficial de cargos esconde os milhares de designados.

Como funciona

A regra geral da administração pública para evitar privilégios e garantir equidade é contratar servidores por meio de concurso público. Cargos comissionados, em que o governante eleito pode escolher qualquer pessoa de sua confiança para ocupá-los, deveriam ser a exceção. As pessoas contratadas para ocupar cargos comissionados de confiança deveriam ser nomeadas para ocupar aqueles cargos e essas informações deveriam ser transparentes para a sociedade.

Existem dois casos muito específicos que deveriam ser a exceção dentro da exceção em relação aos cargos comissionados. O primeiro deles acontece quando o titular que foi nomeado para ocupar um cargo comissionado de comando precisa ser substituído temporariamente — férias, licença-saúde etc. O segundo caso ocorre quando o governo cria uma nova estrutura organizacional por meio de decreto, mas ainda não criou os respectivos cargos por meio de lei e, enquanto isso, precisa que alguém responda temporariamente, em caráter excepcional, por aquela estrutura.

Nestes dois casos em vez de nomear alguém para “ocupar” os cargos, pode simplesmente designar alguém para responder temporariamente por aqueles cargos. É importante destacar que tanto a nomeação quanto a designação são discricionárias e podem ser feitas e desfeitas a qualquer momento pelo governante.

Entretanto, o Governo do Estado de São Paulo vem utilizado a forma jurídica da designação como um expediente para não contabilizar e não dar transparência sobre a quantidade de cargos comissionados. A manobra contábil funciona assim: para o mundo jurídico a nomeação é uma forma de provimento (ocupação) de cargo público, enquanto a designação é mera forma de desempenho temporário, excepcional, de servidor para cargos ou funções de comando.

Estudo de caso

Segundo um estudo elaborado em 2017 pela Associação dos Especialistas em Políticas Públicas do Estado de São Paulo — AEPPSP — existem mais designações do que nomeações para cargos de comando (direção e chefia) no Governo do Estado de São Paulo. Ao todo, a Administração Direta paulista possuia 4.868 designados e 2.831 nomeados em cargos comissionados de comando. Não existe transparência sobre os quantitativos de designações.

O principal problema de transparência está no uso da designação como subterfúgio para não nomear — e não contabilizar — um servidor e colocá-lo para “responder pelo expediente de cargo vago“. Se o cargo existe e está sem titular nomeado, qual o sentido de designar alguém para responder pelo mesmo e mantê-lo “vago” ao invés de nomear a pessoa e contabilizar apropriadamente o cargo como ocupado?

Desse modo, o comando constitucional que exige publicação oficial dando transparência ativa do quantitativo de cargos comissionados de todos os órgãos estaduais é driblado. Trata-se de um grave problema tanto de transparência como de gestão pública:

As entidades da administração direta e indireta, inclusive fundações instituídas ou mantidas pelo Poder Público, o Ministério Público, bem como os Poderes Legislativo e Judiciário, publicarão, até o dia trinta de abril de cada ano, seu quadro de cargos e funções, preenchidos e vagos, referentes ao exercício anterior.” (Constituição do Estado de São Paulo, artigo 115, § 5º.)

Para todos os efeitos práticos, não exista qualquer diferença concreta entre uma nomeação e uma designação: a remuneração, os benefícios e as responsabilidades são idênticas. Trata-se de mero truque contábil engendrado por meio da manipulação de conceitos jurídicos. A relação oficial de cargos do Governo do Estado de São Paulo pode ser conferida no Diário Oficial do Estado e também nas seguintes planilhas:

A tabela a seguir mostra a quantidade e a proporção de servidores comissionados por tipo de vínculo da Administração Direta do Governo do Estado de São Paulo. A quantidade de designados já está descontando os casos em que um mesmo servidor esteja simultaneamente nomeado para um cargo comissionado e tenha sido designado para outro — o que em si também é um abuso, mas tema para um próximo artigo. Nesses casos, o servidor foi contabilizado apenas como nomeado. Este critério garante que não exista dupla contagem e restringe a quantidade de designados exclusivamente àqueles servidores que não estão contabilizados como comissionados na publicação realizada anualmente no Diário Oficial do Estado.

Total de cargos comissionados na Administração Direta11.429
Cargos de assessoramento nomeados3.730
Cargos de comando nomeados2.831
Cargos de comando designados (não contabilizados)4.868
% de designados (não contabilizados)42,6%

Segundo informações solicitadas pela Rede pela Transparência e Participação Social — RETPS —  à Secretaria de Planejamento e Gestão utilizando a Lei de Acesso à Informação, em março de 2017 havia 1.769 servidores designados para responder pelo expediente de cargo de comando vago no Governo do Estado de São Paulo. Este número também não entra na contabilidade oficial.

O que seria um uso razoável

O instrumento da designação deveria ser utilizado de maneira sóbria e íntegra, exclusivamente para cobrir vacância temporária do titular de cargo de comando ou em casos excepcionais após criação de um novo órgão. Nada impede que haja a devida contabilização, transparência e accountability na prestação de contas oficial dos cargos vagos, dos cargos ocupados via nomeação e, também, dos cargos “ocupados” via designação.

Em Pernambuco, por exemplo, o termo designação é utilizado para substituição temporária. Se porventura ela se torna permanente, o antigo ocupante é exonerado do cargo e o substituto é nomeado. Além disso, as designações geralmente vêm motivadas e com período determinado.

O Governo do Estado de São Paulo pode modernizar suas práticas de gestão pública e passar a dar efetiva transparência do quantitativo total de cargos comissionados, inclusive os designados, sem truques jurídico-contábeis.

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Se você quiser aprofundar mais detalhadamente neste assunto, continue a leitura na página seguinte:

7 Comentários

  1. Comissionados dificultam e complicam tudo, burocratizam, bloqueiam o uso da informatização, emperram o andamento do serviço dos concursados complicando dia a dia as necessidades dos cidadãos, infelizmente é a “corte portuguesa”. Parabéns pela coragem e iniciativa. Mais um leitor, com certeza.

  2. Crei9 que mais que pessoas, a sociedade deva escolher projetos…e projeto nao vejo ninguém debater. Essa matéria mostra detalhe de uma pratica que deveria ser combatida…deveriamos ter metodologias de voz, tanto na formulacao quanto no desenvolvimento de politicas e praticas na gestao pública, sendo criados dispositivos de controle efetivo por parte do povo. No popular..nāo cumpriu …sai e entra outro. Se o povo constitui representantes que nao se atentam a vontade popular: FORA!

  3. Parabéns pelo trabalho, pesssoal! A base para propostas que revolucionem SP e o país depende de informação bem apurada e engajada. E vocês conseguiram! Ganharam um leitor!

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